domingo, abril 30, 2006

A equação do empobrecimento do trabalhador

O número que de facto denuncia a crescente exclusão e empobrecimento do trabalhador, sob o novo paradigma tecnológico é a queda da renda, traduzida pela redução constante da participação da massa salarial na geração da riqueza.
Muitas pessoas nos questionam sobre nossas afirmações de que as novas tecnologias, aliadas aos novos métodos gerenciais, estariam gerando desemprego. O argumento é de que os índices de desemprego não mostrariam uma tendência explosiva. Isso de fato é uma realidade.
Apesar de reparamos que qualquer que seja o nível de crescimento económico, o número de empregos gerados é sempre menor do que o esperado, o desemprego em si não parece crescer.
No entanto, por todo o mundo, junto com as comemorações de aumentos das exportações, da actividade industrial, do crescimento do PIB, etc., existe sempre uma observação em “letras miúdas”, de que o desempenho do mercado de trabalho “decepcionou”.
Muitos analistas de mercado já apontam a queda na renda dos trabalhadores como factor limitante ao próprio crescimento do sistema capitalista. Como compreender essa aparente contradição?
Suponhamos que numa pequena cidade, numa fábrica hipotética, tenhamos 100 trabalhadores, trabalhando 40 horas por semana a um salário de R$ 5,00 por hora. Nesse caso cada trabalhador receberá R$ 200,00 por semana. O custo directo para a fábrica será de R$ 20.000,00 por semana. Isso corresponde também a “renda” do trabalho.
Agora vamos imaginar que a fábrica instale robôs, redes de computadores e promova uma reengenharia no seu quadro administrativo. Com isso, poderá despedir 50 empregados. Isso reduziria seus gastos com mão-de-obra para R$ 10.000,00 por mês.
A reacção seria imediata, o índice de desemprego explodiria e se tornaria insustentável. Então os donos da fábrica sugerem que as contratações sejam “flexibilizadas”. Nesse caso, a empresa contrata de novo 100 empregados, mas para trabalhar apenas 20 horas por semana com o mesmo valor de R$ 5,00 por hora.
O resultado seria que cada trabalhador passaria a ganhar R$ 100,00 por semana e o custo directo para a fábrica seriam os mesmos R$ 10.000,00. Mas o desemprego não só desapareceria como o salário por hora seria mantido. Novamente haveria reacção, todos sabem que um operário pode trabalhar 40 horas por semana, porque trabalhar só 20?
Então a empresa voltaria a negociar, só que como existe pouco serviço, devido ao aumento da produtividade, a fabrica só poderá pagar R$ 2,50 por hora. Afinal a globalização exige competitividade e salários mais “realistas”.
A fábrica poderia voltar a contratar os mesmos 100 funcionários, usando o tempo extra para qualquer outra finalidade. Cada empregado voltaria a trabalhar 40 horas por semana, mas só receberia R$ 100,00 de salário. Agora não só o desemprego desapareceu, como a evidente sub ocupação também.
Nos dois casos, não há aumento do desemprego, e no segundo, existe até recuperação da utilização da mão-de-obra. Só que a queda na renda do trabalho logo ficaria evidente. O comércio de nossa hipotética pequena cidade, imediatamente sentiria seus efeitos.
A concentração da renda nas mãos dos donos da fábrica também seria logo percebida. Qualquer pessoa, com um mínimo de bom senso, perceberia que os trabalhadores foram prejudicados, por qualquer das “soluções” propostas.
Mas é exactamente assim que a economia global vem funcionando. Como nesse caso, os números são muito mais complexos e dispersos, a compreensão desse mecanismo fica
obscurecida. Muitas empresas de diversos ramos de actividade, em vários países ao mesmo tempo, adoptam essas práticas.
O surgimento do emprego flexível por toda a parte, não é mais do que uma série de variações das situações que descrevemos acima. O emprego informal, terceirizado ou por tempo determinado. O surgimento do autónomo e do micro empresário. Todos esses arranjos apenas mascaram as nossas simplórias continhas.
A equação passa a ser uma relação simples: Manutenção dos direitos trabalhistas é igual a desemprego. Flexibilização do emprego é igual à queda na renda. Como o desemprego tem um impacto político maior e é um indutor de distúrbios sociais, adopta-se a segunda alternativa.
O resultado é que os níveis de emprego e até de ocupação, não parecem cair. Os cultores da economia de mercado então podem demonstrar que as novas tecnologias não estão afectando os empregos. Um ligeiro crescimento do emprego, nos sectores de serviços mais ou menos imunes a automação, completa o quadro de optimismo.
Mas o calcanhar de Aquiles não demora a se revelar: A queda na renda dos assalariados se acentua, e vai minando as bases para o próprio crescimento do mercado. A concentração de renda vai aumentando as tensões sociais.
Por mais complexas que sejam as relações de trabalho dentro do capitalismo globalizado, basta apenas verificar uma única estatística para comprovar a realidade de nossa afirmação: A renda dos trabalhadores sempre cai.
Não importa se o país é desenvolvido ou não, qual a evolução da economia, qual a velocidade de crescimento ou desaceleração, os níveis de inflação, a taxa de câmbio, a balança comercial, a massa salarial é sempre decrescente.
Independentemente de outros factores, a renda dos trabalhadores sempre cai todos os anos. Como isso acontece sem a interferência de governos ou de qualquer organismo ou instituição, a conclusão obrigatoriamente é a de que, sob o novo paradigma tecnológico, o mercado de trabalho tenderá a forçar o empobrecimento e a exclusão de vastas parcelas da população mundial.
http://lauromonteclaro.sites.uol.com.br

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