terça-feira, janeiro 28, 2014

um outro post sobre trânsito

Quando, há umas semanas, a imprensa noticiou as novas alterações ao Código da Estrada, foi muito interessante verificar como o assunto que mais prendeu a atenção foi a "circulação nas rotundas". Ora, isto provou-me definitivamente duas coisas: a primeira é que os portugueses não conhecem o dito Código, porque a nova norma já estava em vigor, o que foi alterado - agravado - (cf. o post anterior) foi a coima. Isto não significa que não o "saibam". "Sabem", mas não conhecem, ou seja, é mais ou menos assim tipo coiso, um bocado como as instruções e os manuais, os tansos que leiam, a gente não tem tempo para isso. A segunda é que o legislador não deve condutor, tenho a certeza; porque, se o fosse, saberia que, no fundo, não importa tanto se as rotundas se fazem assim ou assado; importa, sobretudo, é a gente saber quando e para que direção é que o confrade do lado vai. Bom, para isto existem uns maravilhosos gadgets criados pela inteligência humana chamados "piscas". O "pisca" é um utilíssimo device, um prodígio do engenho e da arte. Só tem um problema: é para ser usado. E usar o pisca, meus amigos, dizer antecipadamente ao outro se vou para a esquerda ou para a direita, tá quieto. Não queria ele mais nada. Na melhor das hipóteses, uso depois de virar. Na pior, não uso ou uso ao contrário (quantas vezes já vi pessoas "piscarem" para a esquerda e virarem para a direita, numa rotunda). E se esta for pequena, nem sequer viro, que dá muito trabalho e gasta os pneus, atravesso a direito, e sai da frente que estou com pressa.
Isto não tem nada de especial. É apenas um sintoma particular de um entendimento geral: a estrada é minha e não a partilho com ninguém, os outros são concorrentes que me disputam a circulação - ou seja, estão ali para me tramar ou atrasar -, usar os "piscas" é denunciar as minhas intenções, é deixar-me desprotegido, é reduzir o meu espaço de liberdade, a minha capacidade de decisão, o meu livre-arbítrio. Para usá-los, eu teria que partir do princípio que vivo em sociedade, que dependo dos outros, que tenho uma relação solidária e de confiança com quem me rodeia. Mas como o Estado existe para me esmifrar e controlar, a polícia está ali para me passar multas e os outros condutores não têm mais nada que fazer do que atravessar-se, fazer-me perder tempo e colocar-me em risco, como aprendi que vivo numa selva onde tenho que ser mais esperto, mais cabrão e mais manhoso do que os outros para sobreviver, estamos conversados.